quarta-feira, 16 de julho de 2014

Simplicidade - dia 28

Vivemos o caos! É o transito barulhento, é o trabalho estressante, é o cotidiano estafante, não importa, pois nenhuma tentativa de ordem abalará a conturbada e  caótica existência moderna. Albert Camus já descrevia em um célebre poema uma rotina mortalmente torturante, já que ela mantem a mente presa em uma jaula sem grades onde somos ao mesmo tempo os presos e os carcereiros. Buscamos a ordem das coisas, mas damos passos e mais passos para o caminho inverso. Estamos submersos no caos. Complicamos o simples, mascaramos o real, vestimos personagens que não nos deveriam ser importantes... Somos a autoridade sobre o vazio, o especialista em assuntos nada interessantes, somos o nada em nós mesmos.

Complicado, não?! Mas pense em quanto complicou as coisas para você mesmo durante sua existência? Como que aquela vivência pueril da simplicidade, onde apenas bastava estar alí, apenas bastava se divertir, apenas bastava descobrir,passou para a insana busca frenética por coisas sem sentido, por aparências, por títulos, por status, por ego. Dizem que as crianças enxergam os elementais, e isto pode ser verdade, pois elas não estão preocupadas em saber se é real ou ilusão, somente estão preocupadas em vivenciar o momento...e desaprendemos justamente isto. Coisas ocorrem em nossas vidas, pássaros cantam, flores brotam, mas não vemos e nem veremos, pois temos de chegar no escritório para nos enfurnar em uma sala cuja única visão é para uma tela de computador no qual, com certeza, você desejaria do fundo de sua alma não estar ali. Em busca de viver, acabamos por tentar sobreviver, e em busca de sobreviver, nos matamos lentamente.

Perdemos a noção do que seja simples, trocamos a vida pelas aparências, trocamos o tudo pelo nada. E neste caos, muitas vezes buscamos fugir de tudo, buscar sermos nós mesmos...e não percebemos que o "sermos nós mesmos" já foi corrompido com ideologias e abstrações que nem deveriam estar alí. Esquecemos de não buscar, de não ser...só sentir, deixar viver.Sim, pois quando buscamos "ser nós mesmos" na verdade estamos atrás de um "eu idealizado"...e somente quando vivemos de fato, quando apenas sentimos, deixamos de portas as máscaras que carregamos desde a tenra idade e apenas nos deixamos levar, sem nos preocuparmos com o eu, o mundo e o resto, é que encontramos a felicidade, pois encontramos a simplicidade ao anularmos nossas máscaras e nos tornarmos uno com o todo e o nada ao mesmo tempo.

Complicado?! Nada...garanto que já experimentou esta simplicidade antes...quando era criança e brincava sem se preocupar se iam te chamar de maluco...Ou quando esteve só, no campo, tomando uma bebida quente, sem pensar em nada..ou quando dançou freneticamente como se não houvesse mundo lá fora, se não houvesse tempo, espaço ou existência...Já vivenciamos esta sensação...e só a vivenciamos pois a mantivemos simples, não procuramos rotulá-la. Somente a vivenciamos...e por isto, por nos tornarmos um todo e um nada ao mesmo tempo, sem preocuparmos com o status quo, é que vivenciamos, nos tornamos simples.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Música - dia 27

Das artes em geral, a música deve ter sido a primeira a ser manifestada pelo homem. E me perdoem os pintores, escultores, artesãos, que irão falar sobre as pinturas rupestres dos homens das cavernas, ou as cerâmicas encontradas em sítios arqueológicos, pois quando o primeiro humanídeo descobriu sua voz, e descobriu o ritmo, e usou para atrair as fêmeas ou atrair boas caças, ali se formou a primeira música humana...Mas não a primeira música da natureza!

E a natureza já demonstra que a música foi a manifestação maior ...Pássaros cantam ao nascer do Sol, o vento toca seus acordes ao soprar as folhas das árvores, o oceano ecoa o som das ondas...A natureza cantarola todos os dias, desde o menor dos grãos de trigo balançando ao sabor da brisa, até mesmo uma estrela em seus momentos finais, emitem ondas que, captadas pelos instrumentos certos - seja nossos ouvidos, como no caso do trigo, seja um radiotelescópio, como no caso da estrela - se transformam em uma harmonia de sons que despertam em cada um sentimentos diferenciados, únicos.

E não importa falarem "isto é apenas barulho", "isto é apenas ruido"...isto é música, para quem sabe apreciar, sentir, deixar levar. A música sempre teve esta capacidade de estar em tudo e em todos, e não ser preciso saber fazer para saber apreciar. Usada e abusada desde cerimônias ritualísticas em que a voz deveria servir para agradar e nos ligar aos Deuses, passando pelas técnicas de cura, onde o som acalmaria e relaxaria, a até mesmo nas festas tribais, onde os instintos estariam aflorados em busca do outro, do contato...A música foi, é e sempre será a companheira ideal da jornada

E mesmo o silêncio tem em si sua música, afinal, já falava Pitágoras sobre a "Musica das esferas", aquela que místicos só podiam ouvir em determinado estado meditativo, que requereria também um certo silêncio. Através do silêncio, ouvimos o nome do Incriado, pois é através do silêncio que este nome se propaga. E qualquer tentativa de manifestar este de forma pronunciável é falha, pois somente no silêncio encontram-se as notas certas, os acordes certos, o som certo...Qualquer outra tentativa é apenas uma representação mínima da Grandeza de tão maravilhoso som.

A música é a maior manifestação de todas, tanto que até nos mitos cristãos, uma das referências para a Divindade é "O Verbo"...e "o Verbo" nada mais é do que um som...uma palavra...Somente a música consegue mexer com todos,independente de etnia, credo ou pensamento filosófico. É quase impossível encontrar quem odeie totalmente qualquer música, mesmo que seja uma cantiga de ninar...Pois é na música que Inconsciente e Consciente se juntam para dançar. É na música que manifestamos os sentimentos, e é na música que nos transformamos.


segunda-feira, 14 de julho de 2014

Erros - dia 26

O mundo realmente não é perfeito. A nossa trajetória entre os círculos do reino de Abred é complicada, mas o que mais choca é que não aprendemos quando nos é ensinado, e sim, quando erramos.

Absurdo?Pois bem, a humanidade teve milênios para aprender que é apenas mais um ser no meio natural, e que assim sendo, deve permanecer em equilíbrio com a Natureza. No entanto, preferimos acreditar que somos os seres superiores da criação, e que portanto, toda a natureza deve servir aos nossos propósitos, e ganhamos como resultado em um ´seculo de erros, percebemos que não somos tão poderosos quanto imaginávamos.

Outro exemplo: A humanidade já sofreu uma hecatombe em uma guerra que teve como um de seus principais objetivos o extermínio de uma etnia. No entanto, esta mesma etnia hoje está envolvida em uma outra guerra, onde está havendo outro massacre de uma outra etnia, e a lição de humanidade não foi aprendida.

Mais um?Quantos erros cotidianos presenciamos em nossa existência, quantos cometemos, em nome daquilo que sabemos ou achamos que sabemos? Quantos amigos perdemos por nenhum dos lados saber diferenciar idéias de imposições, e nenhum dos lados sequer admitir que tem algo para aprender um com o outro?

Assim é o ser humano. Somente consegue aprender algo se comprovar - ou não - que tal coisa é errada. Temos de jogar a antítese em todas as ideias  e clamar aos Deuses do Conhecimento para que a ideia original sobreviva de alguma forma.E ao contrário do que possa parecer, isto não é de todo ruim. Vivemos um mundo onde somente conseguimos ver a luz por conta da existência da escuridão, somente conseguimos atingir a verdade por conhecermos de certa forma o erro. O problema não é aprender somente com os erros, e sim, permanecer neles, se agarrar como se fosse uma boia e você fosse um náufrago.

E por que este é o problema? Simplesmente por não conseguimos evoluir a contento. Nos agarramos a conceitos que, mesmo sabendo que são errados, defendemos de modo totalmente irracional. Mesmo sendo orientados de que aquilo é errado, continuamos agarrados de tal forma, que é quase certo o nosso fracasso como seres humanos, que estão aqui unicamente para aprender e evoluir. A árvore só nasce e evolui depois de renunciar o erro da semente, que a ajudou até chegar ao solo, mas que não a ajudará a ser uma árvore se na forma de semente permanecer. Os primeiros seres terrestres só evoluíram quando renunciaram o erro de permanecer no mar, já que lá, eles não mais conseguiam alimento. Assim é com os seres humanos.

E não é a toa que uma das "castas" da sociedade celto-druídica é a dos bardos...eles são responsáveis por nos contar a história dos ancestrais...principalmente seus erros, justamente para que aprendamos com apenas o conto, e não com a repetição do mesmo erro. Pena que em muitos casos,  não percebemos isto, engessamos nosso aprendizado, e, como consequência, erramos de novo, e de novo, e de novo...

Cabe aí aprendermos com os erros...só atingimos a perfeição depois de conhecermos o erro, e isto é fato!Mas não podemos, jamais, permanecer estáticos, presos a um conceito errôneo, pois tal ato é execrar toda a história evolutiva da Humanidade. 

sábado, 12 de julho de 2014

Recordações - Dia 25

"Um andarilho em uma estrada só possui duas coisas que irá levar consigo até o fim dela:o seu corpo e suas lembranças de onde veio e por onde passou..."

Nós sempre olhamos para o passado para entender como fazer nossas práticas nos dias de hoje. Olhamos dados arqueológicos, olhamos lendas, mitos, tradições passadas de geração em geração. Olhamos a história da humanidade, mas em que momento paramos e olhamos para nós mesmos, nossas recordações, vivências, experiências durante a jornada?!A resposta é assustadora, mas são poucas as vezes que fazemos de fato isto, ao menos como deveria ser feito.

Nossas lembranças, nossas vivências, nossos sonhos de juventude - mesmo que ainda sejamos jovens - são relegados a segundo plano, pois as prioridades sempre são a estabilidade social, econômica, e nos meios interclanicos de hoje em dia, o status quo religioso dentro e fora do clã. Buscamos a pedra monumental que irá marcar nossa existência para as gerações futuras, pensando inconscientemente que assim viveremos eternamente gravados na História. Buscamos um sentido futuro para superar nosso medo da morte, que esta é a única certeza de todas, com já dizia o filósofo.

Mas esquecemos de que ainda estamos aqui, ainda interferimos no mundo ao nosso redor -querendo ou não, para o bem ou para o mal - e esta interferência cria em nós um menir que nós mesmos desaprendemos a enxergar, pois estamos mais preocupados com outras coisas. Estas interferências criam em nós as lembranças daquilo que somos, do que fomos, cria a história de paisagens que só você viu, mesmo estando em meio a uma multidão, pois são seus olhos a interpretar aquelas memórias. Só você se lembrará do gosto daquele sorvete a beira da praia em um dia qualquer do verão, ou a sensação do toque de lábios de um beijo apaixonado que foi dado em alguém que a muito tempo você não vê. Só você saberá o arrepio de susto ao assistir um determinado filme, ou os traumas vivenciados ao presenciar uma tragédia ao vivo. Estas lembranças estão aí, neste menir que você carregará até o final dos seus dias, que pode ser hoje, amanhã, ou daqui a 90 anos...Mas estarão lá, mesmo que você olhe pouco para estas lembranças.

Talvez por repulsa, por medo, por trauma, por não querer ver algo do passado, mas ainda assim, estarão lá...

E um dia, quando menos espera, elas se manifestarão, as vezes de forma até previsível, como a ida até um local que você sabe que vai te lembar alguma coisa, mas as vezes, será de maneira totalmente irracional, como uma pedra no meio de uma avenida em um dia de chuva te fazer remeter a um dia na praia na tua infância. E são estas manifestações que negligenciamos, e é delas que vem as melhores lições que precisamos aprender naquele momento.

Quando falei sobre oráculos talvez tenha passado desapercebido para mim este fato - talvez justamente por nunca ter me atentado para - que estas manifestações das lembranças que surgem do nada, ao acaso, muitas vezes são mensagens dos deuses querendo nos dizer algo. Ou é algo que devamos fazer, ou é algo que devamos procurar, ou é alguém que precise de nossa ajuda. Sempre é algo ao qual devemos prestar atenção...mas a vida cotidiana nos faz postergar isto. Ou as vezes, postergamos por não querer encarar aquilo que sabemos que teremos de enfrentar.

Talvez seja a hora de encarar o menir que carregará até o final dos seus dias...pois é ele a sua única companhia de jornada...e é com ele que irá aprender...